Introdução

INSTRUMENTOS MUSICAIS PORTUGUESES



Para que os instrumentos musicais não se tornem peças de museu é necessário torná-los vivos, continuando a contar a sua história! Será, desta forma, que os nossos jovens enriquecerão as suas referências musicais com a sua própria cultura, seja através do cavaquinho, da guitarra, das violas do continente e ilhas, ou da flauta, entre tantos outros. Os instrumentos musicais são testemunhos dos usos e crenças e dos símbolos aos quais estão associados, tornando-se objectos de arte, da época e do meio social onde são produzidos. E quando os sons se repercutem, transportam-nos para um tempo diferente recordando-nos que foram objectos de mitos e também de rituais e o seu som continua a representar a voz dos antepassados. Por isso, conhecermos de perto estes objectos é conhecermos também um pouco a história do povo português, das regiões onde habita e dos seus hábitos de festa, de religião e de trabalho.

Não sendo eu descendente de construtores de instrumentos musicais, violeiros ou luthiers, desde muito novo que idealizava fazer os meus próprios instrumentos...Cheguei mesmo a fazer alguns exemplares, mas claro, como desconhecia os pormenores mais elementares, como madeiras adequadas, técnicas correctas, fases de construção e todo um conjunto de segredos que só os profissionais do ramo conhecem, o trabalho final, deixava muito a desejar, tanto no aspecto visual como em termos de sonoridade e por esse motivo fui progressivamente abandonando essa ideia.

A oportunidade apareceu inesperadamente em 1983, quando o grupo de professores profissionalizandos de uma escola de Braga, do qual eu fazia parte, resolveu convidar e integrar nas jornadas culturais do final do biénio, a presença de todo o tipo de artesãos da região de Braga, nomeadamente o violeiro Francisco Pinto Machado. O evento durou três dias e eu esqueci por completo os restantes artesãos, permanecendo sempre próximo do senhor que ao vivo ia construindo cavaquinhos, anotando todas as técnicas, tipos de materiais, fases de fabrico e respectivas sequências. Surgiram, assim, a partir daí os meus primeiros instrumentos. No início, tive como é de supor as minhas dúvidas, que só seriam ultrapassadas, quando comecei a frequentar as oficinas dos, hoje, meus amigos, senhor Domingos Machado e filho Alfredo e irmãos Pinto Carvalho, que gentilmente me receberam e que comigo partilharam todos os seus saberes.

Para além de cordofones (instrumentos cujo som é obtido a partir da ressonância de uma corda sob tensão) resolvi dedicar-me também, a instrumentos de índole mais popular, de fabrico mais acessível, pertencentes aos grupos de ideofones, aerofones e membranofones. Em relação a este tipo de instrumentos, dediquei especial importância às flautas transversais, de madeira e de cana e castanholas, trabalhos que geralmente eram realizados por pastores, pessoas que viviam em absoluta solidão, que sentiam e tinham falta de tudo, apenas lhes sobrava o tempo, tempo esse que eles procuravam preencher, decorando com a ponta de uma navalha ou com um ferro aquecido ao fogo, os seus instrumentos com formas geométricas ou motivos alusivos ao meio que os envolvia. A maior parte dos instrumentos que apresento, foram inspirados em exemplares já existentes, tendo no entanto a preocupação de, por um lado, não me afastar muito daquilo que é considerado tradicional e por outro, que o produto final não resultasse numa réplica do instrumento em questão. Não vou entrar em detalhes ou pormenores sobre cada um dos instrumentos, pois, para isso já existem trabalhos publicados muito completos sobre este tema, como por exemplo os etnomusicólogos Ernesto Veiga de Oliveira e Michel Giacometti que ao longo destes anos me foram extremamente úteis em termos de pesquisa.